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Afastado dos negocios politicos; longe das ambições mesquinhas e torpes, que não hesitam em sacrificar as conveniencias públicas aos interesses particulares, me soou no meu retiro que a boa da anályse andava senhoril e donosa por gabinetes e praças, levada em triumpho tal, que não bastaria a descrevê-lo a penna de Amador Arraes; que por ella se jurava a morte da eschola polytechnica e o exalçamento glorioso do collegio dos nobres, com as opas, sotainas, fitas e medalhas, gregos, latins, rhetoricas, esgrimas, danças e mais petrechos, a que, com muitissima graça, se chama, creio eu, elementos de uma educação liberal; que as paredes dessa famosa cozinha, perfumada durante mais de meio século pelos vapores suavissimos de saborosos guisados, hoje barbaramente convertida em laboratorio chimico e empestada por moxinifadas que o proprio satanás revelou a Lavoisier para perder o genero humano; que essas paredes, digo, como que sorriam á esperança de um melhor futuro, e que os echos das abobadas do venerando edificio, obrigados a repetir hoje o latim arrevesado, os grecismos endiabrados dos naturalistas, phýsicos, chimicos e mathematicos, se aprimoravam e puliam para repercutir a melodiosa declinação de hora horae, os sonoros aoristos do verbo tio e os compassados galopes da contradança e da equitação; que, emfim, os nomes dos membros da commissão d'instrucção pública, assignalados com o ferrete da ignorancia, pregados no pelourinho daquella anályse, seriam talvez legados á posteridade, como a estátua de Leclerc, para todos os que passassem lhes cuspirem affrontas, até a consummação dos séculos.

Sabe-se que os pontifices mais instruidos mandavam procurar em todos os paizes os mais preciosos manuscriptos; de Leão X escreve Ginguené: "Não poupava despezas nem rodeios junto das potencias estrangeiras para fazer procurar nos paizes mais remotos e até nos estados do norte livros antigos ainda ineditos." O modo como estes rodeios eram efficazes, explica-se pela prohibição de certos livros e pela instituição da censura, que no século XV se exercia em Hespanha e em Portugal, como vêmos pelo Leal Conselheiro de El-rei D. Duarte. Os livros eram entregues á auctoridade ecclesiastica para serem examinados, e sob qualquer pretexto de escrupulo não eram mais restituidos. Basta vêr a quantidade de canções obscenas e irreligiosas que o Cancioneiro portuguez da Vaticana encerra para se conhecer como veiu a caír na mão da auctoridade ecclesiastica e como sob ordem superior esse livro antigo ainda inedito foi remettido para Roma. Alem d'isto, a paixão pela Renascença da antiguidade, que começou no seculo XV, fez com que nos diversos paizes decaísse repentinamente o amor pelos seu monumentos nacionaes. D'esta falta de amor pelo proprio passado proveiu para Portugal a perda de muitos manuscriptos, como o da novella Amadis de Gaula, de muitos cancioneiros manuaes, como relata Faria e Sousa, pelo que dizia o Dr. João de Barros no principio do seculo XVI, que estas cousas se secavam nas nossas mãos. D'esta falta de estima pelos monumentos nacionaes, veiu o dispersarem-se pelas bibliothecas da Europa muitos thezouros da nossa litteratura, como se prova pela existencia da Demanda do santo Greal na bibliotheca de Vienna, dos livros de Valentim Fernandes na bibliotheca de Munich, do Leal Conselheiro de D. Duarte, Chronica de Guivé de Azurara, e Historia geral de Hespanha na bibliotheca de Paris, do Roteiro de D. João de Castro no Museu britanico, e do Cancioneiro do Conde de Marialva, da Satyra de infelice vida do Condestavel de Portugal em Madrid. A saida do grande Cancioneiro de Portugal pertence a esta forte corrente de dispersão. No fim do seculo XV alguns portuguezes eruditos se distinguiam na Europa pelas suas riquezas litterarias; em uma Memória sobre as relações que existiam antigamente entre os flamengos de Flandres, especialmente os de Bruges e os Portuguezes, cita-se: "João Vasques, natural de Portugal, mordomo de D. Isabel de Portugal, Duqueza de Borgonha: Vasques possuía uma Bibliotheca, ou pelo menos diversos manuscriptos de valor." Entre esses livros figuravam Histoire de Troie la grant, e alguns tinham as armas de Portugal na encadernação, como o velino Horae beatae Mariae Virginis. Tambem no seculo XV figuravam no estrangeiro os eruditos Diogo Affonso de Mangaancha, Vasco Fernandes de Lucena, Achilles Estaço, e outros muitos amadores bibliophilos. Cuidava-se em comprar livros impressos, por meio das Feitorias portuguezas, mas os manuscriptos sobre tudo os da litteratura medieval perdiam-se com a mais censuravel incuria. Sabe-se por uma carta de João Rodrigues de dirigida a Damião de Goes, que el-rei D. Affonso V mandou vir de Italia Frei Justo, a quem fez bispo de Ceuta, com o fim de escrever em latim a historia dos antigos reis de Portugal, e que todos os documentos que lhe foram entregues se perderam na sua mão, por ter repentinamente fallecido da peste.

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