United States or Fiji ? Vote for the TOP Country of the Week !


Diz qu'em huma beldade, Em quem mostrou o cabo a natureza, Não ha tanta crueza, Qu'hum tão constante amor desprezar queira, E tão verdadeira; Mas tu, que de razão jamais curaste, Porqu'era dar-me a vida, ma tiraste. FRONDOSO. A quem, Belisa ingrata, t'entregaste? A quem déste, cruel, a formosura, Qu'a meu tormento , se devia? Porqu'huma deixaste, firme e pura?

Vem, como quando o raio transparente Deste nosso horizonte, qu'escondido, Deixa hum certo temor á mortal gente, Causado de ver o Orbe escurecido; E quando torna a vir claro e luzente, Alegra o mundo todo entristecido: Que assi he para mi tua luz pura Claro sol, como a ausencia noite escura. Não te quero eu a ti mais qu'a meu gado? Não sou eu mesmo aquelle que tu amaste?

Porque não t'abrandava Est'amor, que me tu tão mal pagaste? Mas pois ja me deixaste Co'a esperança de ti toda perdida, Perca, quem te perdeo, tambem a vida. Ja agora em branda cera Os montes são tornados e os penedos; E os rios, qu'estão quedos, Sentírão meus suspiros, minhas queixas. Tu , cruel, me deixas, Qu'es mais, que montes e penedos, dura, E fugitiva mais qu'a fonte pura.

Porque, dura, engeitaste De hum verdadeiro amor, que tu bem vias, A , que conhecias, Por outra de ti nunca conhecida? Perca, quem te perdeo, tambem a vida. DURIANO. Vai-se co'o seu pastor o manso gado, Porque d'amor entende aquella parte, Qu'a natureza irracional lh'ensina. O rustico leão sem algum'arte, Do natural instincto ensinado, Aonde sente amor, logo se inclina.

Esta he, certo; Que não he d'outrem tanta formosura. Se poderei fallar-lhe de mais perto? Mas fugir-me-ha. Oh temor grande! oh grande desvario, Qu'a voz m'impede, e a lingua negligente Assi m'está tornando, e o peito frio! De quanto me sobeja, estando ausente, Que para lhe fallar sempre imagino, Tudo me falta quando estou presente. Oh aspecto suave e peregrino!

DURIANO. Então, cruel, verás se te merece Com tamanho desprêzo ser tratada Hum'alma, que d'amar-te se preza. Mas como poderás ser desprezada, Se o menos qu'em ti fóra se parece, Póde abrandar dos montes a aspereza? Porque se a natureza Em ti o remate poz da formosura, Qual será a pedra dura, Qu'a teu valor resista brandamente?

ALMENO. Se a vista não m'engana a phantasia, Como ja m'enganou mil vezes, quando Minha ventura enganos me soffria; Parece-me, que vejo estar lavando Huma Nympha algum véo no claro Tejo, Que se m'está Belisa figurando. Não póde ser verdade isto que vejo; Que facilmente aos olhos se figura Aquillo que se pinta no desejo. Oh acontecimento, qu'a ventura Me para mor damno!

Ja que minha ventura, Ou a causa qu'a ordena, Quer qu'em pago da dor tome o soffrella; Será mais certa cura Para tamanha pena Desesperar d'haver ja cura nella. Porque se minha estrella Causou tal esquivança, Consinta meu cuidado Que me farte de ser desesperado, Para desenganar minha esperança: Pois somente nasci Para viver na morte, e ella em mi. Oh Nympha delicada, Honra da natureza!

Ornou sublime esfôrço ao grande Atlante, Com qu'a celeste máchina sustenta; Honrou a Homero o engenho, com que intenta Grecia do quarto ceo passá-lo avante; Coroou claro Amor de amor constante A Orpheo, na paz firme e na tormenta; Inspirou a Fortuna, em tudo isenta, A Cesar, de quem foi hum tempo amante; Exaltaste tu, Fama, a gloria alta De Alcides no monte em que resides; Mas Castro, em quem o Ceo seus dões derrama, Mais orna, honra, coroa, inspira, exalta, Que Atlante, Homero, Orpheo, Cesar e Alcides, Esfôrço, engenho, Amor, Fortuna e Fama.

Em dor vai convertido o soffrimento, Em pena convertida a piedade; A razão tão vencida da vontade, Qu'escravo faz do mal o entendimento. A lingua não alcança o qu'a alma sente. E assi, se alguem quizer em algum'hora Saber que cousa he dor não comprehendida, Parta-se do seu bem, porque exprimente Qu'antes de se partir, melhor lhe fôra Partir-se do viver para ter vida.