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Pobre Neves! quem te predisséra o supplicio dos teus derradeiros annos, ligada ao destino da mulher que tu crearas com maternal ternura!... Entretanto, o padrinho de Narcisa não escarmentava no sestro de casamenteiro; é certo porém que similhantes casos assim funestos, não se repetiram nas suas operações matrimoniaes.

Narcisa sahia-lhes de rosto nas concavidades das congostas escuras, e abocava-lhes á cara uma pistola de dois canos; e elles, com um fingido sorriso de piedade despresadora, atiravam-lhe a forçada esmola. Outras vezes, escalava as janellas das alcôvas conhecidas, e entroixava os bragaes como se inventariasse o espolio de um esposo fallecido.

Um dia, a justiça, perseguindo Narcisa pelo roubo de uma coberta de fêlpo, soube que a Neves a mandara vender. A ordem de captura involveu-a como receptadora de roubos. Invadiram-lhe judicialmente a casa, e encontraram, para maior prova do crime, um açafate de maçãs camoezas, dois calondros e algumas batatas que Narcisa recolhera, de colheita aliás suspeitosa, nas lojas da casa da sua protectora.

Ás vezes entrava n'aquella casa a Narcisa do Bravo, sentava-se á mesa ainda abundante do padrinho, e matava a fome. A irmã do cego debulhava-se em pranto a confrontar aquella desgraçada de rosto empolado com esfoliações rubras á formosa noiva de Custodio da Carvalha, á gentil amazona por amor de quem alguns fidalgos de Guimarães terçaram as suas badines de caoutchouc na romaria de S. Torquato.

Dobados dez annos de vertiginosa dissipação, o lavrador resvalou do idiotismo á sepultura, amando ainda a mulher que vendera um lençol para lhe comprar a ultima gallinha. E Narcisa, viuva aos vinte e oito annos, e ainda formosa, atirou com a honra ás goelas do dragão da miseria, e não chorou uma lagrima. Havia uma amiga que lhe dizia palavras dolorosas, com sincero : era a irmã do cego.

Sobre todas as famas repellentes, ganhara Narcisa, com legitimo direito, a de ladra, e ladra á mão armada. Os mais queixosos eram os que lhe colheram as flôres outoniças da belleza, e a regeitaram com a brutalidade do tedio.

Os regedores das freguezias que ella frequentava tinham ordem de a capturarem; mas o mêdo, predicado pacifico d'estes magistrados, era a resalva de Narcisa.

Narcisa chorava, beijando a mão do cego, que se estorcia nas dôres da cystite. Ao cahir da noite, a prostração, a febre, os soluços, e o frio das extremidades diagnosticavam a gangrena. No 1.^o de dezembro, o cego de Landim expirou reclinado ao seio de Narciza, que se sentara no leito para o amparar nos derradeiros arrancos.

Sentou se no leito, e inspirou consoladoramente a columna de ar frigidissimo que lhe bateu no rosto, ao abrir da janella. Pediu uma chavena de café, e, emquanto a irmã o fazia, Narcisa veiu para a beira do padrinho. Quem é? perguntou o cego. Sou eu, padrinho. Está melhor? Vou estar melhor, filha. Isto vai acabar. Quando eu morrer, faze companhia á minha pobre irmã...

Cumprida a sentença, D. Anna das Neves Miquelina Monteiro vendeu a casa que o irmão comprára em nome d'ella. Com o producto d'essa venda transferiu-se, em 1872, ao Brazil, e levou comsigo Narcisa do Bravo. Parece que não tinha outros amores n'este mundo, e desejava expirar, como o irmão, nos braços d'ella.

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