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Até que delle soube ser achado Em huma anzina envolto em pobres panos; E daqui veio, que Anzino fui chamado. Neste meu desengano outros enganos Fundou de novo a pouca dita minha, Com que o vim a servir mais de sete annos. Tinha muito de seu, e mais não tinha De filhos, que huma filha bem formosa, Á qual por morte delle tudo vinha.

LIMIANO. Não são logo assi, não, outros pastores, Que de promessas vãas te fazem rico, E nunca fructo dão: tudo são flores. Mas desejo saber com quem pratíco, Porque não caia em falta, e porque entenda A quem tamanho amor devendo fico. ANZINO. Antes que tempo nisso se dispenda, Busquemos hum lugar mais fresco e frio, Que da calma, que cahe, bem nos defenda.

Apartar-te do gado leva em conta; Que, pois com elle fica o pegureiro, Que te detenha hum pouco, pouco monta. O meu nome he Anzino: fui vaqueiro Na grã serra da Estrella, que não tive; Não sei se natural, ou se estrangeiro. Hum pastor me criou, que ja não vive; De todos por seu filho era julgado; E eu tambem neste engano hum tempo estive.

Que sendo assi, te digo Que não espero mais Nesta para mi sempre ingrata terra. Quem traz guerra comsigo Entre seus naturais, Não deve d'estranhar estranha guerra. ANZINO. Limiano, ja bem tenho entendido Quanto sentes meu mal; mas eu te digo Que o teu mal he de mi menos sentido. E, pois o dia ja passado temos, Vamos-nos mais chegando para o gado; E nas outras cousas fallaremos.

Mas antes que o sol naquella frágoa, Onde meus ais dilata a triste Ecco, Vou-me segurar mais o barco na ágoa, Porque de baixa mar não fique em sêcco. ANZINO e LIMIANO. Parece-me, pastor, se mal não vejo, Que ja te vi mais ledo andar outr'hora Nos largos campos do famoso Tejo. LIMIANO. Podia ser; que muito tempo fóra Andei desta ribeira, patria minha, Onde triste me vez andar agora.

Ou ja criação seja, ou ja destino, Tanto que não o , geme e suspira. Como menos fara o triste Anzino? Tangia mal na frauta, mal na lira; Despois tão bem tangia, qu'era espanto A quem antes d'amor tanger m'ouvíra. Assi com tal temor, com tal estudo, Amor fui grangeando longamente, Á conta deste amor perdendo tudo.

No bem, como no mal, tambem me enleia: Inda agora o senti, ja reina e manda. Como queres, Anzino, qu'eu te creia Cousa que nem sonhada foi tégora? Não sabes de quem ama, o que receia? Fallarei com meu pae: fica-t'embora: No desengano seu teu bem consiste; Da palavra que dei não estou fóra. Com isto me deixou alegre e triste.

Onde vou visitar na urna estreita Os santos ossos do Varão divino, Que pretendeo do Mestre o mão direita. Assi, d'hum lugar n'outro de contino, O bem que ja cantei, chorando venho; Tornei-me de vaqueiro, peregrino: Tal hábito me vês, tal vida tenho. LIMIANO. Anzino, he breve o dia Para poder contar O que sinto de tua desventura.

Verás cahindo em gottas crystal puro No vão d'huma caverna carcomida, Por entre o musgo molle, verde-escuro. ANZINO. Quem traz á saudade a alma rendida, A saudade busca, onde descansa; Maso descanso della encurta a vida. Com tudo, quem do ceo na terra alcansa Poder gozar-se desta liberdade, Que mais deseja ter? que mais o cansa?